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DEMOLIÇÃO

Fomos ensinados a criar edificações suntuosas, belas, tecnológicas, mas não aprendemos nada sobre como projetar o fim desta edificação. Sim, é necessário que conversemos sobre o fim, não há glamour, não será a priori visto, e talvez você em vida nunca o veja, mas te garanto que atualmente é tão, ou mais importante que a necessidade de construir. O que se faz com as centenas de toneladas de entulho? Estamos fadados a converter milhares de horas de trabalho e recursos naturais finitos a lixo? A qual custo?

Nightingale Estate, Hackney Downs, 1999 - Hackney Council

Assim como cenas de acidentes, cenas de demolições têm a sua dramaticidade. É sempre um ato contundente, direto, e terminante. É uma definição de que a construção que existe não é mais necessária, nem útil, e é preferível que se reduza a escombros.

Sempre que penso que milhares de horas de trabalho humano direto e indiretamente dedicados a esta construção se vai junto com o repique do martelete, é triste. Triste por que de-significamos vidas de forma repetitiva, descartamos o suor do trabalho de quem se empenhou em toda a cadeia de construção desta edificação.

Já parou para pensar na magnitude da cadeia de envolvidos na construção de, por exemplo, uma simples casa? Vamos fazer um exercício rápido, apenas para se dar uma ideia; na edificação de uma casa de padrão construtivo tradicional, começamos na mineração, uma atividade extrativista que consome os recursos minerais em uma velocidade que a terra é totalmente incapaz de repor, ou seja, são recursos finitos. E para alguns recursos esse limite está no limiar. Retira-se o minério de ferro, manganês, níquel, cromo, enxofre, e mais uma infinidade de componentes apenas para a produção de aço. Retira-se o carbonato de cálcio, sílica, alumínio, e ferro geralmente por meio de detonações de rocha calcária para a produção do cimento. Já para a produção do concreto é necessário a adição de brita e areia, sendo esse último recurso – surpreendentemente - já escasso em alguns países, e apontado como um recurso que teremos falta nas próximas décadas gerando uma nova crise. Veja este texto, e entenda um pouco mais sobre esta questão.[1]. Saindo da mineração, entramos na indústria de beneficiamento destes recursos naturais, passando pelas gigantes indústrias cimenteiras e siderúrgicas, sendo a primeira individualmente responsável pela produção de 5% de todo o dióxido de carbono liberado na atmosfera, ou seja, tem uma grande responsabilidade frente às mudanças climáticas. Ainda há a indústria de produção de blocos, telhas, acabamentos, cerâmicas, tintas, cabos, tubos plásticos, vidros, perfis de alumínio, enfim, há uma escala colossal de pessoas envolvidas e de extração de recursos naturais finitos, retirados continuamente, ciclicamente, aparentemente até quando for naturalmente possível. Estamos em marcha acelerada para o abismo.

Man. By Steve Cutts

E a verdade é, nós construímos para demolir, construímos de forma irresponsável e irrefletida, o ciclo de vida de uma edificação é breve comparado todo o impacto gerado e mesmo assim não projetamos uma edificação que esteja preparada para o seu inevitável fim, preparada tanto no sentido ambiental, quanto econômico e social.

A indústria da construção civil é a maior responsável pela geração de resíduos na natureza, no Brasil produz cerca de 50% dos resíduos, e é a maior responsável também pelo consumo de recursos naturais. Se diminuir a pegada ambiental é um desafio para cada ser humano, os que estão envolvidos na indústria da construção civil tem uma responsabilidade ainda maior.

Será que sempre estaremos fadados a agir de forma destrutiva enquanto seres humanos, ou é possível outro modo de relação com o outro? Esse outro vai desde os biomas, animais, e o próprio homem. Todos são negativamente impactados pela contínua ação extrativista-predatória.

Encaramos esta realidade como um convite à reflexão, inserindo este enorme problema antes dos primeiros traços no papel, a escolha pelo universo da pré-fabricação é uma decisão ética antes de qualquer outro aspecto, é buscar produzir edificações que sejam recicláveis, desmontáveis, remontáveis, reaproveitáveis. Olhando por este prisma fica óbvio – pelo menos para gente – repensar como produzimos arquitetura.

O que realmente importa? A forma da vez? O traço ousado? Ou assumir a responsabilidade ambiental enquanto agente da construção?

[1] https://www.archdaily.com.br/br/893075/a-proxima-crise-da-sustentabilidade-nos-estamos-usando-tanta-areia-que-ela-pode-realmente-acabar

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